Bengala preservada para atuais ministros

14/02/2021 08h08

Até fechar esta coluna nada ainda decidido sobre a indicação da deputada Bia Kiss (PSL/DF), para a presidência da Comissão de Constituição e Justiça, da Câmara. Há um imbróglio criado desde que o presidente Arthur Lira se comprometeu com a sua indicação e setores do Judiciário passaram a considerar o fato como uma “declaração de guerra” ao poder.

Embora haja várias outras restrições ao  nome da deputada em função de suas ações de hostilidade a  ministros do STF comenta-se que Bia Kiss teria o propósito de destravar na pauta da Câmara a matéria que trata da “PEC da bengala” , para supostamente  beneficiar o presidente Bolsonaro , criando a possiblidade de nomear ainda nesse seu governo, vários ministros nos tribunais superiores.

Ao que parece está acontecendo um grande equívoco da imprensa em relação a essa pauta. Para esclarecer a coluna ouviu o promotor de justiça e professor   Marcos Romulo, mestre em direito e um dos quadros mais conceituados no Ministério Público, que afirma:

“A revogação da PEC da Bengala não deve atingir os ministros beneficiados por ela.

A PEC 159/19 pretende que a aposentadoria compulsória dos ministros dos tribunais superiores volte a ser aos 70 anos de idade, revogando a EC 88, que elevou esse limite de idade para os 75, com efeitos nos tribunais estaduais.

Otto von Bismarck, o chanceler de ferro prussiano, disse uma vez que quem gosta de leis e de salsichas, não deveria assistir ao seu processo de fabricação. De fato, os motivos por trás da confecção de uma lei nem sempre são aqueles abertamente declarados. O professor San Tiago Dantas gostava de mencionar casos em sala de aula, dentre os quais o livro de sucessões do código civil napoleônico, o qual determinou que a herança fosse dividida entre todos os filhos legítimos, oferecendo razões de equidade. Na realidade, foi uma vingança de Napoleão contra seus adversários da aristocracia rural francesa, cujo poder político era baseado na concentração de terras.

Só para os próximos

No caso da revogação da emenda que resultou da PEC da Bengala, a razão invocada seria supostamente combater a estagnação na carreira judiciária. Na prática, comenta-se que a ideia seria provocar a aposentação de ministros do STF com mais de 70 anos, permitindo, assim, ao Presidente da República preencher as vagas abertas, aumentando sua influência na Corte.

Acontece que se a PEC vier a ser aprovada, é provável que somente atinja aqueles ministros que vierem a completar 70 anos após a promulgação da emenda, sem alcançar, porém, os que já atingiram aquela idade, os quais se aposentariam normalmente aos 75 anos. Não fosse assim, estaríamos diante da hipótese de cassação e a norma seria enquadrada como uma tentativa de FRAUDE À CONSTITUIÇÃO, igualmente conhecida como desvio de poder constituinte ou atalhamento constitucional, fenômeno relacionado à tentativa de se atingir obliquamente uma medida vedada por norma constitucional proibitiva ou impositiva de resultado”. (Marcus Romulo)