O tempo e suas transformações

29/11/2024 12h12
O tempo e suas transformações

O tempo, dizem, é implacável. Não para, não volta, não perdoa. Mas talvez seja mais que isso. O tempo, ao mesmo tempo que desgasta, também molda. Ele transforma, de maneiras sutis ou drásticas, aquilo que conhecemos, aquilo que somos. Ele nos pega pela mão e nos leva para longe do que era, mesmo quando tentamos segurar firmemente o que foi.

Há dias em que me pego olhando para fotos antigas. Lá estou eu, cercado por pessoas que talvez nunca mais veja, em lugares que não são mais os mesmos. Aquele sorriso, aquela rua, aquela casa... Tudo parece tão vivo, tão presente na memória, mas ao mesmo tempo tão distante. Não é curioso como as memórias, mesmo congeladas em fotografias, se desgastam como uma velha pintura que perde a cor? O tempo as desgasta, sim, mas também as torna mais preciosas, quase como relíquias de quem já fomos.

Os lugares, então, são um caso à parte. A praça onde brincávamos quando crianças hoje é outra. O banco onde minha avó se sentava para contar histórias sumiu, substituído por algo moderno e funcional, mas sem alma. As árvores, que pareciam eternas, foram trocadas por postes ou por concreto. E, no entanto, se fecho os olhos, ainda posso ver tudo como era, com uma nitidez que o presente não consegue apagar. O tempo muda os lugares, mas as memórias os mantêm vivos, pelo menos dentro de nós.

E as pessoas? Ah, o tempo é especialmente hábil em transformá-las. Os rostos que um dia conhecemos vão ganhando rugas, os cabelos mudam de cor, os sorrisos se tornam menos frequentes – ou, às vezes, mais livres, menos presos às expectativas. Nós mesmos mudamos. O que antes parecia vital, agora é apenas uma lembrança vaga. Os sonhos que carregávamos, tão grandes e tão urgentes, foram substituídos por outros. E, aos poucos, percebemos que o tempo não nos tira apenas coisas; ele também nos dá. Ele nos ensina, nos fortalece, nos amadurece.

Mas o tempo, com sua habilidade de transformar, também nos provoca. Ele nos força a revisitar quem éramos e a perguntar quem somos agora. Ele nos mostra que aquilo que parecia eterno é, na verdade, transitório. Ele nos ensina que a saudade não é só dor, mas também um sinal de que algo valeu a pena.

E, ao mesmo tempo que o tempo muda tudo, ele também preserva o essencial. Porque, por mais que os lugares mudem, por mais que as pessoas sigam caminhos diferentes, por mais que as memórias se desgastem, há algo que permanece: o impacto de tudo o que vivemos. O tempo pode transformar, mas não apaga. Ele nos molda, mas não nos redefine por completo. Somos, no final das contas, um mosaico de quem fomos, de onde estivemos, de quem amamos.

Então, talvez o tempo não seja um vilão, como às vezes gostamos de pensar. Ele é um escultor, um poeta, um arquiteto. Ele muda, mas também constrói. Ele nos afasta de coisas, mas nos aproxima de nós mesmos. E, ao olhar para trás, percebemos que cada transformação foi, de alguma forma, necessária para sermos quem somos hoje.

E é por isso que, mesmo quando o tempo nos parece cruel, devemos olhar para ele com um misto de reverência e gratidão. Porque, no final, o que ele transforma, ele também eterniza. E isso, talvez, seja o maior presente de todos.