O fim de uma era

30/07/2025 00h12
O fim de uma era
Mesmo sem provas, 35% creem que urnas foram fraudadas em eleições de 2022, diz pesquisa - Foto: Reprodução/internet

Na política alagoana, sempre houve um pouco de poesia de cordel: versos fáceis, promessas rimadas, personagens carismáticos que surgiam do nada e se agarravam a uma multidão como quem pula num jegue em disparada. Era o tempo dos puxadores de voto. Um candidato bem votado bastava para arrastar consigo uma comitiva de ilustres desconhecidos para dentro da Assembleia. Não mais.


O jogo virou. E virou pesado.


As eleições de 2026 não serão para amadores, nem para aventureiros com páginas movimentadas no Instagram. Serão para quem souber fazer conta. O quociente eleitoral — esse senhor que antes ninguém respeitava muito — resolveu bater à porta com autoridade. E entrou de sola.


Alagoas continuará com seus nove deputados federais, é verdade, mas perderá três cadeiras na Assembleia Legislativa. De 27, cairá para 24. Parece pouco, mas é como diminuir o número de cadeiras em um ônibus já lotado. Quem quiser sentar, vai ter que empurrar com mais força. Ou desistir da viagem.


E o preço da passagem aumentou: 212 mil votos para federal, 71 mil para estadual. É isso. Não é mais sobre ser popular, é sobre ser coletivo. Não basta um nome forte, é preciso uma nominata afinada, um partido com pulmão, um projeto com pernas.


A conta é simples, mas os efeitos são dramáticos. O quociente eleitoral se calcula dividindo os votos válidos pelo número de cadeiras. Menos cadeiras, mais votos. Não há mágica. E, nesta eleição, as sobras serão mesmo... sobras. Não vão mais salvar ninguém.


A paisagem política já começa a mudar. Os partidos pequenos, que antes se reuniam em torno de um ou dois candidatos com chance de explodir nas urnas, agora estão em pânico. Porque a eleição virou maratona de revezamento. Quem não tiver equipe para correr os 42 quilômetros juntos, vai ficar pelo caminho.


As grandes legendas — MDB, PL, PT, PP, PSD — esfregam as mãos. Têm estrutura, têm prefeitos, têm exércitos de cabos eleitorais treinados. E, agora, têm o vento soprando a favor. A concentração do poder partidário será quase inevitável. E os independentes? Os candidatos que ainda acreditam em "missão", em "projeto de vida", em "servir ao povo"? Esses talvez precisem de um milagre. Ou de uma federação que os aceite com benevolência.


As eleições de 2026 sepultarão o romantismo da política solo. Acabou a era do "fulano que corre sozinho". Agora, é tudo em grupo. A vaga virou conquista de time. Mais do que voto, é preciso organização. Mais do que carisma, é preciso voto distribuído — no Sertão, no Agreste, na capital e em cada vilarejo onde o rádio ainda é rei e a promessa ainda é moeda.


O candidato de 2026 precisará se reinventar. Não bastará gravar vídeos simpáticos na feira, dar bom dia no Instagram, nem visitar lideranças apenas em tempos de campanha. Será preciso ter mapa, cálculo, base real, presença física. Os partidos terão que virar quartéis, com comandos, estratégias e disciplina. Não há mais espaço para improviso.


Essa nova configuração tem um cheiro forte de filtro. E nem sempre filtros são ruins. Talvez a Assembleia fique mais técnica, mais comprometida, mais coerente. Ou talvez, apenas mais fechada, mais elitizada, mais dependente das grandes estruturas que já controlam o jogo.


No fim das contas, o eleitor — esse ser sempre subestimado — ainda carrega o poder do lápis na urna. Mas agora, ele votará dentro de uma lógica que não lhe foi explicada. Votará num nome, mas elegerá outro. Ou não elegerá ninguém. E talvez só perceba isso na hora em que os eleitos começarem a legislar — por si, pelos seus, pelos que financiaram suas campanhas. Como sempre foi. Mas agora, com menos cadeiras e mais regras.


O tempo dos puxadores de voto está acabando. A fila vai andar. E quem quiser um lugar ao sol da política alagoana em 2026 vai ter que vir com bloco montado, samba ensaiado e orquestra completa. Porque a festa da democracia — essa que tanto se invoca nas campanhas — ficou bem mais cara e com lista de convidados restrita. E a porta, como se sabe, só se abre pra quem tem a chave. Ou sabe onde ela foi escondida.