Variedades
Mulheres Rodadas ridicularizam o machismo em bloco no Rio
Da marchinha ao funk, foliãs feministas foram hoje (10) protagonistas do bloco Mulheres Rodadas, que saiu nesta Quarta-Feira de Cinzas, no Largo do Machado, zona sul do Rio de Janeiro. Criado no carnaval do ano passado como reação a atitudes machistas nas redes sociais, o bloco cresceu e ganhou centenas de colaboradores e uma banda com mais de 100 músicos, formada majoritariamente por mulheres.
Uma das fundadoras do bloco, Débora Thomé, se surpreendeu com a repercussão do bloco, que originalmente era apenas virtual, e acabou virando matéria de jornais internacionais, como o New York Times. “Vimos uma postagem de uma página chamada Jovens de Direita que dizia ‘Não mereço mulher rodada”. Criamos então um evento no Facebook, de brincadeira. No dia seguinte mais de mil pessoas haviam confirmado presença. O jeito foi sair com o bloco”, disse.
A música que inaugurou o cortejo foi “Geni e o zepelin”, do compositor Chico Buarque. Mas a “Geni rodada”, em vez de pedras, recebeu confetes e serpentinas na nova versão. A homenageada deste ano foi a atriz Leila Diniz, personificada na instrutora e foliã de pernas de pau Raquel Potí.
“Leila Diniz é um ícone da liberdade, coragem e da transgressão em relação aos costumes da mulher no Brasil e no mundo”, afirmou Raquel, que .”Esta foi a última fantasia que ela vestiu em vida em 1972, na Banda de Ipanema. A fantasia tem estrelas no peito e ela as tirava para amamentar a filha ainda bebê na época. É uma fantasia bem representativa”, ressaltou Raquel. Leila Diniz quase foi presa por desacato ao pudor, em plena ditadura, por amamentar a filha em público.
Autora de frases como “Você pode muito bem amar uma pessoa e ir para cama com outra”, Leila é um ícone ainda não superado disse uma das fundadoras do bloco, a jornalista Renata Rodrigues. Ela lamentou que o machismo continue limitando os direitos das mulheres, como apontou pesquisa recente do Instituto Data Popular, em que quase metade dos entrevistados disse que bloco de carnaval não é lugar para mulher “direita”.
“O que estamos fazendo é político, é subversivo. É uma brincadeira lúdica de ridicularizar o machismo, mas também é séria, pois os números estão aí, desigualdade de gênero, violência, desentendimento sobre os direitos das mulheres”, exemplificou.
“Ano passado uma integrante do bloco levou um soco ao tentar defender uma menina que sofria assédio. Precisamos sair da Idade Média, se não der para chegar no século XXI, que pelo menos a gente consiga chegar no século XX”, disse ela. “Porque temos o direito de celebrar o nosso corpo, de ser sensuais na rua. E ninguém tem direito ao seu corpo, de te agredir física ou verbalmente”.
Renata destacou que o grupo tem o apoio da ONU Mulheres em ações relacionadas ao fim do assédio no carnaval e à garantia de direitos das mulheres, dentre elas o serviço telefônico 180 sobre direitos e serviços públicos para a população feminina.
A festa teve sósias de Fridas Kahlo, ciganas, pombas-gira, Carmens e dezenas de mulheres purpurinadas, floridas, com bambolês e pernas de pau, todas “rodadas”, com palavras de ordem pela descriminalização do aborto e igualdade de gênero. Os homens “rodados” também participaram, como um dos batuqueiros do bloco, Alexandre Flores.
“Sou pai de uma menina e espero que ela cresça em um mundo menos machista ou, de preferência, sem machismo. Estou lutando também pela minha filha, porque o machismo não tem nada a ver”, disse. “Ano passado, eu só assisti e, este ano, pintou uma vaga na bateria e vim com o maior prazer”.
O cortejo foi até o Aterro do Flamengo, zona sul, com canções referentes ao universo feminino e à “rodação”, como “É hoje”, de Ludmilla, “Crazy in love”, de Beyoncé, “Eu também quero beijar”, de Pepeu Gomes e “Tieta”, de Caetano Veloso.
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