Política
Lula: de “não sabia de nada” no mensalão a integrante de organização criminosa da Petrobras
Quando o mensalão se tornou público, em 2005, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva repetiu algumas vezes que “não sabia de nada” sobre o esquema de corrupção que envolvia a compra de apoio parlamentares pelo Governo. Ele escapou ileso do escândalo e conseguiu não só se reeleger, como formar uma sucessora no Planalto. Com a investigação que se seguiu durante o seu segundo mandato, entrando no Governo Dilma, o então procurador-geral da República, Roberto Gurgel, apontou o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu como sendo o “chefe da quadrilha” na denúncia apresentada em 2011 ao Supremo Tribunal Federal. Dirceu acabou condenado por corrupção ativa e formação de quadrilha no julgamento da Corte em 2013. Um ano depois, logrou reverter a pena por formação de quadrilha, mas não por corrupção.
Agora, Rodrigo Janot, maior autoridade do Ministério Público Federal (MPF), indicado em 2011 pela presidenta Dilma, e reconduzido ao cargo neste ano, pede investigação sobre a tentativa da presidenta de obstruir a Justiça, e denuncia Lula pela mesma razão. Junto com José Carlos Bumlai, que está preso, e seu filho Mauricio Bumlai, Lula teria atuado com o objetivo de tentar “comprar o silêncio” do delator Nestor Cerveró, ex-diretor da Petrobras.
A PGR pede investigação do ex-presidente por ser partícipe da organização criminosa responsável pelos crimes investigados na Lava Jato. “A organização criminosa [que atuou na Petrobras] jamais poderia ter funcionado por tantos anos e de uma forma tão ampla e agressiva no âmbito do Governo federal sem que o ex-presidente Lula dela participasse”, escreve Janot.
Especialistas reconhecem que a denúncia de Janot e o pedido de investigação feito por ele envolvendo o ex-presidente ainda precisam ser aceitos pelo Supremo e posteriormente embasados com provas. Os pedidos do procurador-geral têm como principal esteio a delação premiada do senador Delcídio do Amaral (sem partido). Pelas informações que têm sido vazadas para a imprensa, o parlamentar ainda não apresentou nenhum indício concreto do envolvimento de Lula ou dos outros citados por ele no esquema de corrupção da Petrobras. Mas a denúncia apresentada por Janot acende a luz vermelha na cúpula petista.
Isso porque começa a se desenhar um cenário jurídico complexo, no qual Lula pode enfrentar julgamento por vários crimes. Num paralelo com outro grande juízo que envolveu o PT, começam as bolsas de apostas sobre o risco de o ex-presidente ter o mesmo destino de outros figurões do PT, como Dirceu e José Genoino: a prisão. O petista é o líder histórico da legenda, e grande esperança do partido para disputar uma eventual eleição antecipada ou o pleito de 2018. À semelhança do escândalo de 2005, o PT está novamente no olho do furacão. Mas agora, sem o colchão da prosperidade econômica daquela época para atenuar os efeitos sobre o juízo popular.
Se a denúncia e o pedido de investigação contra ele forem aceitos, ele corre o risco, ainda, de encontrar uma Corte Suprema arisca. Para o professor de direito penal da Universidade de São Paulo Gustavo Badaró, o STF tem, desde o mensalão, sinalizado um entendimento amplo de “co-autoria” em casos de corrupção como esse. De acordo com ele, o tribunal considera “difícil” que em uma “estrutura vertical” como o Governo e suas ramificações “certas ações tenham se desenvolvido sem participação efetiva dos altos escalões ou sua ciência e conivência”. Badaró, no entanto, diz não acreditar que a corte irá aceitar ou não a denúncia contra Lula apenas com base no fato de que ele estaria na presidência.
Há um elemento que pode não definir, mas prejudicar Lula perante a corte. O ex-presidente se indispôs com o Supremo ao dizer, durante conversa telefônica grampeada pela Justiça, que a corte estaria “acovardada” frente aos procuradores da Lava Jato. Nos áudios divulgados com a autorização do juiz Sérgio Moro, responsável pelos processos de investigação na Petrobras, Lula também disparou contra Janot, ao dizer que ele seria “ingrato”.
Se dependesse dos procuradores do MPF no Paraná provavelmente o petista já estaria nas mãos de Moro – e possivelmente já julgado e condenado. Em março a força-tarefa da operação apontou que Lula seria “um dos principais beneficiários dos delitos” investigados envolvendo a corrupção na Petrobras. “Surgiram evidências de que os crimes o enriqueceram, financiaram campanhas eleitorais e o caixa de sua agremiação política”, dizia o despacho dos procuradores. O núcleo paranaense da Lava Jato foi responsável pelo pedido de condução coercitiva de Lula para depor sobre as acusações envolvendo um apartamento tríplex no Guarujá e um sítio em Atibaia.
No final da noite de terça, o Instituto Lula reagiu duramente às ações da procuradoria geral. Segundo a nota, “a peça (…) indica apenas suposições e hipóteses sem qualquer valor de prova”. Para o petista, “trata-se de uma antecipação de juízo, ofensiva e inaceitável, com base unicamente na palavra de um criminoso”, diz em referência a Delcídio. “O ex-presidente Lula não participou nem direta nem indiretamente de qualquer dos fatos investigados na Operação Lava Jato”, rebate. “Lula não deve e não teme investigações”.
Ainda que não seja condenado, para as ambições de Lula, que quer se recandidatar à presidência em 2018, a notícia desta terça-feira é um balde de água fria. O ex-presidente terá de empreender tempo para se defender de acusações num momento em que ele já admitia a sobrevivência de sua sucessora no Planalto, humilhação esta que ficará marcada na história do partido. Agora, corre o risco de ser cingido pela Lava Jato.
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