Internacional
Europa deve ser 'construtora de pontes' para paz na Ucrânia, diz Papa na abertura da JMJ
Evento realizado em Portugal deve contar com a participação de mais de um milhão de peregrinos de todo o mundo até domingo
O Papa Francisco pediu, nesta quarta-feira, que a Europa seja "construtora de pontes" para a paz na Ucrânia, no início de sua visita de cinco dias a Lisboa para participar da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), um grande evento para uma Igreja Católica que enfrenta o avanço do secularismo no Velho Continente.
Em sua chegada ao aeroporto militar, o jesuíta argentino de 86 anos foi recebido com honras militares antes de iniciar a sua intensa agenda na capital portuguesa, onde são esperados até domingo cerca de um milhão de jovens católicos de todo o mundo.
— Olhando com grande afeto para a Europa, no espírito de diálogo que a caracteriza, apetece perguntar-lhe: para onde navegas, se não ofereces percursos de paz, vias inovadoras para acabar com a guerra na Ucrânia e com tantos conflitos que ensanguentam o mundo — questionou o Papa, de 86 anos, durante seu primeiro discurso durante a Jornada Mundial da Juventude (JMJ).
O Pontífice argentino lamentou ainda que "no oceano da História, estamos navegando num momento tempestuoso e sente-se a falta de rotas corajosas de paz", afirmou às autoridades e corpo diplomático portugueses no centro cultural de Belém, pedindo repetidamente pela paz na Ucrânia desde o início da invasão russa em fevereiro de 2022.
Francisco também recordou "o sonho europeu de um multilateralismo mais amplo do que o mero contexto ocidental", capaz de "captar o mais débil sinal de distensão e de o ler por entre as linhas mais tortas da realidade".
— O mundo precisa da Europa, da Europa verdadeira: precisa do seu papel de construtora de pontes e de pacificadora no Leste europeu, no Mediterrâneo, na África e no Médio Oriente — destacou.
Fiel aos temas centrais de seu pontificado iniciado em 2013, o Papa criticou os flagelos que enfraquecem, segundo ele, o Ocidente, como as políticas de imigração, a crise demográfica, a eutanásia e o comércio de armas.
— Para onde navegais, Europa e Ocidente, com o descarte dos idosos, os muros de arame farpado, as mortandades no mar e os berços vazios? Para onde ides se, perante o tormento de viver, vos limitais a oferecer remédios rápidos e errados como o fácil acesso à morte, solução cômoda que parece doce, mas na realidade é mais amarga que as águas do mar? — indicou.
Portugal aprovou em maio uma lei que regula "a morte assistida", unindo-se ao grupo de países europeus que legalizaram a eutanásia e o suicídio assistido, como os da Benelux e a vizinha Espanha.
Sensível ao tema da ecologia, Francisco abordou o desafio do aquecimento global, justo quando o planeta acaba de enfrentar o mês de julho mais quente já enfrentado.
— Os oceanos aquecem e, das suas profundezas, sobe à superfície a torpeza com que poluímos a nossa casa comum. Estamos transformando as grandes reservas de vida em lixeiras de plástico — lamentou.
Pouco antes, Francisco havia se encontrado no Palácio de Belém com o presidente português, o conservador Marcelo Rebelo de Sousa, após atravessar a cidade, tomada pela JMJ. Ao som de seus tambores e cantando canções como "Esta é a juventude do Papa", centenas de peregrinos o esperavam desde o início da manhã para receber um Pontífice muito popular entre os jovens católicos.
— Nós o amamos muito porque ele nos transmite o amor que Deus tem por nós. Acho que o fundamental é o seu carisma — disse Byron Santiago Chojolar, um peregrino de 26 anos da Guatemala.
Para Samuel Namaver, um estudante americano de 17 anos, "a diferença com outros Papas é que ele é latino-americano".
— Ele gosta de contato, de brincadeira, faz muitas referências futebolísticas. Sabe como chegar ao nosso coração — acrescentou.
As autoridades de Lisboa mobilizaram 16 mil integrantes das forças de segurança, do serviço de proteção civil e do setor de emergências médicas para o evento.
A menos de dois meses do início no Vaticano de uma assembleia que deve examinar o futuro da Igreja em Roma, a JMJ é vista como um termômetro sobre a posição dos jovens católicos a respeito de questões como o tratamento das pessoas LGBTQIA+, o eventual casamento dos padres ou a posição das mulheres.
Antes de seu primeiro encontro com os jovens na quinta-feira, a agenda de Francisco é dedicada na quarta-feira às autoridades e ao clero deste país, onde 80% dos seus 10 milhões de habitantes se definem como católicos.
Vítimas de pedofilia
Quarto Papa a visitar Portugal, onde já esteve em 2017, Francisco pôde aproveitar a estada para abordar a delicada questão do abuso sexual de menores na Igreja, seis meses depois de uma comissão de especialistas independentes do país publicar um relatório chocante .
O documento, divulgado em fevereiro a pedido da Conferência Episcopal Portuguesa, revela que 4.815 menores foram vítimas de abusos sexuais em contexto religioso desde 1950. Estas agressões foram acobertadas pela hierarquia eclesiástica de forma "sistemática", segundo o relatório dos especialistas.
Segundo a Conferência Episcopal Portuguesa e o chefe da comissão organizadora local da JMJ, o Papa deve reunir-se em privado com as vítimas destes abusos, embora este encontro não conste do programa oficial.
No sábado, Francisco fará uma rápida visita ao santuário de Fátima, antes de regressar a Lisboa para participar de uma grande vigília, e presidir a missa final no dia seguinte.
Considerada o maior encontro internacional de católicos, a JMJ foi criada em 1986 por iniciativa de João Paulo II.
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