Internacional
Radicais do clima desafiam governo da Alemanha, que se afastou das metas climáticas após vencer eleições
Membros de movimento surgido em 2021 picham monumentos famosos e se colam ao asfalto para denunciar inação
Durante a campanha para eleições gerais em 2021, o então candidato Olaf Scholz prometeu ser "o chanceler da causa climática". O social-democrata venceu, porém, o acerto de coligação entre seu partido, os Verdes e os Liberais Livres para que ele pudesse governar tinha outras prioridades. O cenário se agravou mais ainda com a eclosão da guerra na Ucrânia em fevereiro de 2022, com a Rússia fechando a torneira do gás barato que vendia havia décadas à Europa, o que levou à reabertura de usinas termelétricas a carvão. Com as metas climáticas do país jogadas para escanteio, ganhou força um movimento ambientalista radical incipiente no país que resolveu adotar medidas mais drásticas para se fazer ouvir e chamar a atenção da sociedade.
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Ativistas do grupo Ultima Geração, fundado em 2021, tomaram espaço nas ruas, bloqueando alamedas na hora do rush, pichando lugares emblemáticos que garantem alta visibilidade — como o Portão de Brandemburgo ou o Relógio da Hora Mundial em Alexanderplatz, ambos em Berlim. Eles colam as mãos no asfalto ou a estruturas sobre rodovias com Super Bonder. Com essas táticas, entretanto, além da atenção, atraem também a ira de muitos. A imprensa e na classe política rotulam o movimento de "extremista", e seus integrantes já foram apelidados de KlimaKleber (algo como "coladores do clima").
'Mudança no sistema'
A maior mobilização pública pelo clima iniciou-se em 2018 com o movimento Fridays for Future (Sextas-Feiras pelo Futuro), que ganhou protagonismo mundial com o ativismo da adolescente sueca Greta Thunberg, levando a uma greve geral por medidas contra as mudanças climáticas em 19 de março de 2019, que reuniu cerca de um milhão de pessoas em 125 países. A lentidão na ação governamental, na visão dos ativistas, e a reviravolta ocorrida na Alemanha nos últimos tempos, no entanto, atiçou um novo radicalismo ambiental.
— Continuaremos até que haja uma mudança de sistema —disse ao GLOBO o porta-voz do grupo, Theodor Scharr. — O governo não consegue nem mesmo implementar medidas simples como o limite de velocidade de 100 km/h nas rodovias, medidas que têm apoio da maioria da população. Um primeiro passo para essa virada política seria um plano concreto de como conseguiremos extinguir a indústria do carvão, gás e petróleo até 2030.
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Aos 32 anos, Scharr se mostra sereno e focado, enquanto delineia motivos por que largou sua vida confortável numa cidade vizinha a Berlim para se transferir à luta no asfalto. Para ele, a questão climática é também uma questão de justiça social entre ricos e pobres, e entre o Norte e o Sul Global.
As críticas do grupo ao que entende por inatividade do governo federal são corroboradas pelo Conselho Alemão para o Desenvolvimento Sustentável (ERK, na sigla em alemão), que indicou uma equipe de cinco especialistas para avaliar as medidas adotadas pelas autoridades com o objetivo de atingir a neutralidade na emissão de gases de efeito estufa, a principal meta do Acordo de Paris de 2015.
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Planos 'vagos'
Brigitte Knopf, vice-diretora do ERK, apresentou, no fim de agosto, as conclusões da avaliação do conselho sobre os atuais planos do governo:
"O foco do programa climático do governo abrange setores que já foram alvo de foco no passado, como a diminuição de verba para a energia fóssil (...) ou a reforma fiscal energética. Os setores que mais contrariam as metas climáticas são o de transportes e o da construção civil". Knopf classificou os planos do governo como "vagos".
O movimento mais comportado, o Sextas-Feiras pelo Futuro, já tinha conseguido uma vitória histórica em março de 2021, quando o Tribunal Constitucional da Alemanha, a mais importante corte do país, considerou "insuficientes" medidas do governo para redução de emissões até 2030. Na sentença, até então sem precedentes, o tribunal entende que não é responsável agir como se não houvesse amanhã em detrimento das futuras gerações.
— De certa forma, os protestos dos últimos quatro anos, mudaram o mundo. Ficou claro [para os partidos] que é possível vencer eleições tendo o meio ambiente na agenda. Isso ainda não é suficiente, mas é mais do que havia sido conquistado antes — disse Luisa Neubauer, líder do movimento na Alemanha.
Justamente com a intenção de conseguir avançar ainda mais nas conquistas, nasceu o Última Geração, já com uma greve de fome da qual fizeram parte sete ativistas em agosto de 2021. . Na época, pleiteavam uma conversa cara a cara com os três candidatos às eleições gerais para falar sobre a crise climática. Além disso, exigiam a formação de um "Conselho de Cidadãos" para decretar medidas imediatas. Hoje, as revindicações do grupo — que já tem adeptos de todas as faixas etárias — mudaram: extinção da subvenção da energia fóssil, limite de 100 km/h em rodovias, fim da indústria produção de gás, petróleo e carvão até 2030 com o devido amortecimento social.
— O nosso movimento se direciona exatamente para a inatividade da classe política — diz Scharr.
Pesquisas indicam que o movimento não tem apoio expressivo entre os alemães, embora 44% tenham se declarado a favor de grandes protestos em uma enquete do Centro de Ciências Sociais em Berlim sobre a radicalização dos protestos dos ativistas climáticos no país. Apenas 25% das 2.800 pessoas entrevistadas em janeiro passado apoiaram protestos como os do Última Geração. Mas, para os autores da pesquisa, ficou claro que a preocupação com o clima não diminui, o que acaba abrindo espaço para um movimento com um ativismo mais radical.
— Parece que tudo o que se fez antes, como votar nos Verdes, organizar manifestações, não foi suficiente. O Partido Verde é membro do governo e, da perspectiva do movimento, não conseguiu implementar a política pública como esperado — disse Daniel Saldivia Gonzatti, pesquisador do Centro de Ciências Sociais em Berlim.
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