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Snipers, motoristas de caminhão e drones: mulheres se preparam para combates em meio à guerra na Ucrânia

Com população mais de três vezes menor que a Rússia, país depende de seus próprios civis para repor forças; nesse cenário, público feminino inicia treinamento militar

Agência O Globo - 09/11/2023
Snipers, motoristas de caminhão e drones: mulheres se preparam para combates em meio à guerra na Ucrânia

Após 20 meses de guerra em larga escala na Ucrânia, os combatentes se estagnaram em batalhas no sudeste. O fornecimento de armas e pessoal é crucial — e, embora o país tenha se beneficiado de armamentos doados pelo Ocidente, ele depende de sua própria população como reservatório para repor forças. Nesse cenário, as mulheres começaram a se preparar para o combate.

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— Ninguém quer lutar nas trincheiras. É antinatural querer isso — afirmou Olha Bakhmatova, 46, uma psicóloga que participou de um treinamento para o uso de armas de fogo e combate urbano em Kiev no último fim de semana. — Mas se não eu, quem? — continuou, pontuando que era “inevitável” que mais mulheres acabassem lutando na guerra.

Atualmente, cerca de 43 mil mulheres servem nas forças armadas ucranianas, de acordo com o Ministério da Defesa, um aumento de cerca de 40% desde 2021, o ano anterior à invasão em larga escala da Rússia. O aumento proporcional, no entanto, é menor do que o das forças de combate masculinas, que mais do que triplicaram no mesmo período.

Desde a invasão, o exército já aboliu restrições que impediam as mulheres de desempenhar funções como atiradora de metralhadora, comandante de tanque e atiradora de elite, e suspendeu regras que as proibiam de dirigir caminhões. Foi aumentado o limite de idade para recrutas femininas (de 40 para 60 anos, o mesmo que para os homens).

No início, as mulheres assumiram funções de combate em grupos paramilitares ou contornaram regras. Elas foram feridas, capturadas e mortas, embora o exército não divulgue números de baixas tanto para homens quanto para mulheres. O esforço do Exército em atrair mulheres é um passo de igualdade, mas também reflete o preço da guerra.

‘O gênero de um guerreiro’

As sessões de treinamento exclusivamente femininas têm como objetivo proporcionar um ambiente de aprendizado em que as mulheres não se sintam menos qualificadas do que os homens, e onde seus esforços não sejam constantemente comparados com a força física masculina. Para Darya Trebukh, fundadora do grupo ucraniano Valkiriya, que lidera a iniciativa, “o gênero de um guerreiro não faz diferença”.

— O que me atraiu é que [o treinamento] é apenas para mulheres — disse Halyna Vynokur, de 26 anos, que compareceu ao local com uma amiga após ver um anúncio no Instagram. — É mais confortável, especialmente pela primeira vez. Como mulheres, estamos todas no mesmo nível. Todos entendem que a guerra não vai acabar em um mês. Eu não quero, nunca quis, mas entendo que devo estar pronta.

Na sessão recente, as iniciantes aprenderam a ajustar a alça de um fuzil Kalashnikov: muito frouxa e ela salta, muito apertada e não é capaz de se posicionar rapidamente para disparar. O instrutor masculino, um paraquedista em serviço ativo, demonstrou como recarregar um carregador, limpar um cartucho travado e atirar em posição deitada.

Subornos para evitar o recrutamento

Os casos de atrito se tornaram mais comuns. Em julho, a polícia prendeu funcionários dos escritórios de recrutamento militar por receberem subornos de US$ 250 (R$ 1,2 mil) a US$ 1,5 mil (R$ 7,3 mil) de homens para evitar o recrutamento, e o presidente Volodymyr Zelensky demitiu todos os chefes regionais dos escritórios de alistamento devido a preocupações com suborno.

Em agosto, o exército reduziu as isenções para doenças crônicas. Agora, homens com tuberculose assintomática, hepatite e H.I.V. são elegíveis para o recrutamento. Em junho, o exército endureceu as isenções para homens que cuidam de parentes com deficiência ou que estão estudando em escolas de pós-graduação, cuja matrícula aumentou desde a invasão.

A primeira indicação de um possível recrutamento de mulheres entrou em vigor em 1º de outubro, com uma lei que exige que as mulheres com treinamento médico se registrem nos escritórios. Elas não estão sendo convocadas, mas são obrigadas a passar por exames médicos e receber cartões de recrutamento. O grupo tem sido atraído em particular para pilotar drones usados para vigilância ou para lançar explosivos.