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Eu e a Braskem
Fábrica Braskem, entre o mar, a lagoa Mundaú e encravada na parte urbana do bairro do Trapiche.
Éramos meninos, meninos, maloqueiros e reis de um paraíso, nosso reinado: a bela cidade de Maceió. A praia da Avenida da Paz, o coreto, era o ponto de encontro da boa turma divertida. Entre nós não havia diferença social, racial ou religiosa. Havia uma escala de valores: quem melhor jogava ou nadava ou os melhores contadores de histórias. Infância feliz, livre, leve e solta. De repente a puberdade, fomos descobrindo seus encantos.
Pela manhã, logo cedo, hora do racha, futebol na areia branca e limpa. Ainda suados um mergulho no mar azul esverdeado, calmo e transparente. Muitas vezes corríamos até o final a praia do Trapiche da Barra. O ponto de referência na praia era o Morro Tom Mix. Belas dunas do Trapiche e seus imensos coqueiros. Subíamos as dunas com o pé enfiando na areia. Em cima, nos sentíamos donos do mundo. Descíamos pelo lado oposto onde se espelhava a enorme, tranquila e belíssima Lagoa Mundaú com suas ilhas cheias de coqueiros, suas garças voando rente ao espelho d’água, pescando o sustento de seus filhotes em ninhos bem escondidos. Lagoa adentro inúmeros pescadores jogavam tarrafas pescando carapeba, tainha e outros tipos de peixe. Marisqueiras peneirando catavam sururu. Nosso bando percorria a Lagoa Mãe, divertindo-se, descobrindo coisas bonitas e malvadamente matando passarinhos com atiradeiras que levávamos no bolso.
No retorno subíamos o Morro Tom Mix e descíamos pelo o lado da praia sentados em palhas de coqueiros, dava uma sensação gostosa na barriga enquanto escorregávamos sentados nas palhas. Tínhamos inventado o “skybunda”, hoje uma brincadeira adorável nas praias onde existem dunas ou morros. As Dunas do Trapiche, o morro Tom Mix nos fascinavam. De um lado, um mar azul esverdeado e do outro, a Lagoa Mundaú, mãe dos pescadores. Nesse paraíso crescemos, ele ainda vive em nossas almas.
Às vezes partíamos para outros locais, como o Vale do Riacho Salgadinho, onde havia vários sítios. Pulávamos a cerca e ligeiro surrupiávamos: coco, cana, melancia, manga e outras frutas. Era nosso lanche divertido à beira do Salgadinho. Às vezes pescávamos naquela água límpida do riacho que corta toda cidade de Maceió.
O tempo foi dispersando cada menino da Avenida da Paz. Nos anos 70 eu me formei engenheiro, passei a trabalhar na Construtora de um amigo, iniciamos a construir edifícios de apartamento na orla de Maceió. Certa dia o chefe, um visionário, apareceu alegre, havia comprado um terreno na praia do Trapiche para construir um edifício com vista da praia e da lagoa Mundaú. No bairro do Trapiche já havia uma ocupação urbana com belas casas. Na época do início de construção de edifícios na praia de Pajuçara, Ponta Verde, meu chefe, enxergou mais longe. A expansão urbana da cidade seria o belo bairro do Trapiche, o bairro do futuro. Todos os dias havia reunião de planejamento e de um projeto moderno do Edifício do Trapiche. Éramos entusiasmados por aquela obra, o projeto pioneiro faria sucesso, competindo com os incipientes edifícios das praias de Pajuçara e Ponta Verde
Até que um dia nos chegou a sinistra, a trágica notícia: Uma fábrica de produtos químicos clorados seria instaladas entre a praia do Trapiche a lagoa Mundaú. A partir daquele dia houve uma polêmica entre a população pela periculosidade de uma fábrica de produtos de cloro (elemento letal). A Imprensa ajudou a espalhar a mentira que a fábrica traria mais de 2.000 empregos e seria a redenção econômica do Estado. A fábrica iria transformar em produtos químicos a matéria prima, SALGEMA, encontrada em descomunais quantidades no sub solo na Lagoa Mundaú. Poucas vozes surgiram contra a Instalação da Salgema, uma delas, Dr. José Geraldo Marques ainda ecoa, e se tornou líder contra a instalação da fábrica. O Governo Federal, o Poder Econômico, a Petrobrás, interessados, sempre foram bem mais fortes e naquela época não havia consciência ambiental. Não teve jeito, por imposição dos poderosos e da ditadura, a Fábrica Salgema foi instalada numa região de fragilidade ambiental entre o mar e a lagoa. Terraplenaram o Morro Tom Mix, as dunas de minha infância, deu-me uma tristeza! A notícia foi suficiente para desvalorizar todos os imóveis do bairro do Trapiche da Barra e circunvizinhança. (continua).
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