Brasil
Sede da COP30, Pará melhora em desmatamento, mas ainda sofre com queimadas e garimpo ilegal
Para o governador Helder Barbalho, o evento mundial representa uma oportunidade de transformação para a história do estado
Oficializado nesta semana como sede da COP30, a Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, em novembro de 2025, o Pará teve melhora nos índices de desmatamento, mas ainda enfrenta desafios ambientais como as altas taxas de queimadas e fraudes no registro de terras. A decisão da cúpula climática coloca Belém como palco de encontro de líderes mundiais, em novembro de 2025, para discussões sobre meio ambiente e estratégias globais para combater os efeitos do aquecimento global. Para o governador Helder Barbalho, o evento mundial representa uma oportunidade de transformação para a história do estado (leia mais abaixo) — que nas últimas décadas representou o maior obstáculo para a imagem sustentável do Brasil.
O Pará é conhecido como o estado mais vulnerável à extração ilegal de madeira, grilagem e conversão de terras em pastagens. Ocupa a primeira posição entre os estados com mais focos de incêndio em 2023, segundo o Projeto Queimadas, do Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (Inpe). Foram 40.807 casos até 15 de dezembro (22% do total no Brasil), quase o dobro do segundo colocado, Mato Grosso (11,5%).
Modelo antigo
Coordenador da ONG Projeto Saúde e Alegria, o ambientalista Caetano Scannavino aponta que o resultado ambiental é derivado da insistência do estado no modelo de ocupação dos anos 1970, baseado no desmatamento e na conversão de floresta em pastagens com baixa produtividade.
— Esse é um modelo que beneficia poucos, mas deixa a conta para todos pagarem. Estamos desmatando para ficarmos mais pobres — afirma Scannavino, que atua no Oeste do Pará.
Em 2023, a taxa anual de desmatamento no Pará alcançou seu menor valor desde 2018, segundo levantamento do sistema Prodes, do Inpe. Mas o estado permanece na liderança dos índices na Amazônia Legal pelo menos desde 2008, quando a série histórica foi iniciada, com 40,85% da área desmatada.
Em sua passagem pela COP 28, no início de dezembro, Barbalho celebrou a redução de cerca de 50% do desmatamento no Pará nos 11 primeiros meses do ano, em comparação ao mesmo período do ano passado.
Scannavino reconhece que a gestão de Barbalho está acima da média na questão ambiental, se comparada às anteriores. Mas se o governador reduziu danos em seu primeiro mandato, há cobranças para o segundo.
— O desafio atual é combater garimpos, ser mais incisivo e não empoderar os municípios no licenciamento da mineração, e estruturar a política ambiental para lidar com as mudanças climáticas — enumera.
Pesquisador da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Lucas Ferrante avalia que, apesar do discurso sustentável, Barbalho usa as pautas ambientais como propaganda e não põe em prática planos efetivos de contenção do desmatamento e de mitigação das mudanças climáticas.
— O Pará já encara os graves efeitos das mudanças climáticas e governo estadual não tem adotado todas as medidas de contenção do desmatamento e queimadas. Vemos uma propaganda verde com o intuito de defender um desenvolvimento que não será sustentável — critica.
O MapBiomas alerta para o avanço do garimpo no Sudoeste do Pará. Entre os locais em risco, estão a região ao redor do Rio Tapajós, que chegou a ficar com as águas turvas em janeiro de 2022, e do Rio Xingu. A pressão sobre a Terra Indígena Kayapó também preocupa.
— Os garimpeiros desmatam as margens dos rios e fazem a introdução de metais pesados, como o mercúrio. Essa utilização polui os corpos hídricos e impacta a população local, que precisa da água para alimentação, comércio e locomoção — explica Luis Oliveira, coordenador da equipe da Amazônia no MapBiomas.
No Sudeste do estado, a região da Serra dos Carajás, maior província mineral do Brasil, com a maior mina de minério de ferro a céu aberto do mundo, operada pela Vale, é ameaçada pelo garimpo ilegal.
A região foi apontada há três anos pela Agência Nacional de Mineração como local de oportunidade de investimentos para futuras áreas disponíveis por processos de mineração caducados, renunciados ou desistidos. Em 2020, por causa da extração de minério, o município de Canaã dos Carajás chegou a registrar o maior Produto Interno Bruto (PIB) per capita do país: R$ 591.101,11 (a população chegou a 77.079 pessoas no Censo de 2022, um aumento de 188,51% em comparação com 2010).
Indefinição fundiária
Advogada e pesquisadora do Imazon, Brenda Britto afirma que o Pará está imerso em instabilidade fundiária. Brenda explica que há 12 anos, uma decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) cancelou administrativamente títulos com indícios de falsificação. Mas a especialista identifica brechas que permitem a ocupação ilegal de terras.
— Estamos falando de muito papel falso criado para gerar crédito no banco. Parte dessas áreas existem e os títulos continuam usados, mesmo cancelados, em cadastro rural ou casos de projetos de carbono. É preciso impedir estímulos legislativos aos invasores — alerta.
Para a pesquisadora, o Pará precisa de destinação de terras públicas, e na distribuição, a Constituição prioriza terras indígenas e unidades de conservação.
Dados do Imazon apontam que 28,5% do território amazônico não tem informações sobre destinação de terras. Além disso, entre 2013 e 2020, quando o desmatamento voltou a subir na Amazônia, 40% da perda de florestas ocorreu nessa área de indefinição fundiária. Na avaliação de Scannavino, esse cenário contribui para a criminalidade no Pará.
— Como um empreendedor responsável, com planos de manejos sérios, vai concorrer com o preço da madeira ilegal? Ou ele quebra ou muda de lado. Ao invés do Pará trazer investidores conscientes, o estado atrai organizações criminosas — diz o pesquisador.
'Valorizar a floresta'
Preparando-se para receber a COP30 em 2025, Helder Barbalho quer que o Pará seja um “estado com carbono zero, com emissões neutralizadas”, quando começar a conferência. O governador defende uma política econômica de valorização da floresta e de uso do solo que possa permitir a “conciliação entre a preservação ambiental e o cuidado com a população”.
Quais os planos do governo no combate ao desmatamento?
O estado apresenta uma queda contínua. A soma de esforços com o governo federal, junto a ações de comando e controle, contribuíram para o resultado de 2023. Queremos fortalecer esse trabalho e continuar investindo na bioeconomia.
Como o estado investe no combate a queimadas e na mitigação dos efeitos das mudanças climáticas?
Os focos de incêndio podem ter viés criminoso, mas neste ano a vegetação está extremamente seca e as temperaturas em alta, devido também ao El Niño. Isso trouxe um grande alerta e na minha gestão dobramos o incentivo do Corpo de Bombeiros para o combate do fogo.
O que o governo tem feito contra a instabilidade fundiária?
Chegamos a expedir 17 mil títulos definitivos nos últimos quatro anos e 11 meses a partir de uma estrutura tecnológica que permite a aceleração e a construção junto aos cartórios para ter acesso às informações, garantindo transparência e integridade ao processo.
E como o governo atua para frear o garimpo?
É fundamental uma maior presença dos órgãos de fiscalização e hoje a maior parte dos casos está em áreas federais. É determinante que o Brasil possa ter a rastreabilidade como norma de toda comercialização minerária na Amazônia, fazendo a convergência das informações desde a autorização de exploração de lavras até a emissão de nota fiscal ou da licença ambiental.
Ambientalistas criticam o modelo de ocupação do Pará.
Precisamos apresentar soluções econômicas a partir da valoração da floresta viva, mas não é sustentável preservar a floresta e deixar o povo morrer de fome.
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