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Midiaticamente maquinado
Tudo, tudinho mesmo, nesta vida, acaba sendo uma questão de perspectiva e profundidade. Não tem como escapar.
Ou, sendo curto e grosso, feito pino de patrola, seja nas lides diárias, ou nos entreveros do poder, tem mais chances de lograr êxito, aquele que dispõe de uma clara visão do conjunto e, a partir dessa, ser capaz de traçar uma agenda de médio e longo prazo.
Somente os indivíduos que tomam por base esses dois instrumentos são capazes de antever, com relativa clareza, os caminhos possíveis que podem ser desenhados a partir de acontecimentos que invadem a cena presente. Aliás, essa é a essência, o tutano de uma boa estratégia.
Quando estamos munidos de uma visão de longo prazo, inevitavelmente nos tornamos menos reativos aos furdunços que são apresentados, pela grande mídia e pelas malhas das redes sociais, como sendo um “Deus nos acuda”, o prelúdio do final dos tempos.
Nos tornamos menos reativos porque o alarido midiático não é encarado como se fosse o palco da história, ou como o pano de fundo da eternidade, como fazem muitas pessoas, que se deixam impactar com o espectro do furacão de notícias espetaculosas.
Ao afirmar isso, não temos, de modo algum, a intenção de provocar em nosso íntimo, um silêncio ensurdecedor, similar ao que aconteceu após o segundo gol feito pela seleção do Uruguai no Brasil, na partida disputada no Maracanã na Copa de 1950. Nada disso.
O que almejamos é apenas e tão somente lembrar que as atuais circunstâncias, vividas por nós, com esses pestilentos odores totalitários, podem ser vistas a partir de um estreito e estéril recorte temporal, ou tomando como referência um corte histórico profundo, abrangente e fecundo.
Se optamos pelo primeiro cenário, acabaremos ficando inquietos, ansiosos, preocupados com perigos imaginários, descuidados com ameaças reais e, estando num quadro assim, nos tornamos reativos, fragilizados e, por isso mesmo, facilmente controláveis.
Agora, quando escolhemos o segundo panorama, os quinhentos são outros, porque compreendemos que nada se resolve da noite para o dia e, consequentemente, tornamo-nos mais pacientes, prudentes e, é claro, muito mais astutos.
E isso não ocorre num passe de mágica, ou por meio da intervenção de alguma forma sobre-humana. Nada disso. É porque gradualmente vamos compreendendo o quão complexo é o mosaico que dá forma à realidade e, deste modo, vamos aprendendo a identificar quais são as batalhas reais que merecem a nossa atenção e, destas, quais devemos lutar com todo o empenho da nossa personalidade, com todas as forças do nosso ser.
Por essa razão que o filósofo espanhol Julián Marías ensina-nos que, diante das circunstâncias da vida, é de fundamental importância que examinemos os momentos isolados de nossa época e procuremos ver em que eles diferem das anteriores para, em seguida, referi-los funcionalmente uns aos outros e, principalmente, ao fundo “permanente” da vida enquanto tal.
Ou, como nos lembra, de forma lacônica, a sabedoria confucionista, é muitíssimo fácil perder-se como quando [presunçosamente] julgamos conhecer o caminho.
Enfim, se não estamos dispostos a fazer isso, se desdenhamos a importância dessa trabalhosa prática, invariavelmente estaremos agindo feito marionetes, realizando exatamente o que os nossos adversários querem que façamos, ao mesmo tempo que acreditamos estar montados na razão, por conta de nossa indignação histriônica, fomentada pelo imediatismo irrefletido e midiaticamente maquinado que turva tão bem a nossa limitada visão.
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