Brasil
Estudo tenta desvendar os segredos dos brasileiros com mais de 100 anos de idade
Quarenta centenários de várias partes do Brasil que doaram material genético para uma pesquisa sobre longevidade saudável do Centro de Estudos do Genoma Humano e Células-tronco da Universidade de São Paulo (USP)
O que há em comum entre Davino Cordeiro Leodoro e Deolira Glicéria Pedro da Silva, moradores do Norte Fluminense, e os mineiros Laura de Oliveira e José Bernardo da Silva? Todos já passaram dos 100 anos e estão saudáveis e ativos. Alguns praticam esportes e há quem ainda trabalhe. Eles também fazem parte de um grupo de mais de 40 centenários de várias partes do Brasil que doaram material genético para uma pesquisa sobre longevidade saudável do Centro de Estudos do Genoma Humano e Células-tronco da Universidade de São Paulo (USP). Os pesquisadores querem saber qual o segredo para viver tanto tempo e bem.
— O propósito da pesquisa é estudar a população centenária que está muito bem do ponto de vista físico e cognitivo. A gente brinca que eles são os centenários notáveis — diz o biólogo e pesquisador Mateus Vidigal, que integra o grupo coordenado por Mayana Zatz.
Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais são os estados que concentram os maiores grupos de pesquisados. Pelo menos seis voluntários são do Rio. O estudo começou na pandemia, com apenas três idosos. Os pesquisadores queriam saber, inicialmente, se algum mecanismo genético ou imunológico estava criando defesa no organismo desses centenários contra a Covid-19.
Morador de Campos dos Goytacazes, Davino Cordeiro Leodoro, de 113 anos, é o que está no grupo de estudos da USP há mais tempo. Seu caso começou a ser pesquisado quando, em 2020 e aos 110 anos, contraiu Covid-19 e ficou internado por 18 dias numa enfermaria.
— Meu avô acorda cedo todos os dias, toma café e almoça por volta das 11h30. Gosta de ficar na varanda observando o movimento da rua. Ele ainda é lúcido e, se deixar, quer sair sozinho. — conta Luciana Cordeiro, neta de Davino.
A saúde de ferro é também uma das características de Deolira Glicéria Pedro da Silva, moradora de Itaperuna, que completou 119 anos no último dia 10. Leida Ferreira da Silva, de 63, afirma que a avó só foi ao hospital duas vezes na vida — sem gravidade — e nunca fez uma cirurgia.
A centenária cedeu material biológico para a pesquisa em 2022. Ela pode ainda ser a mulher mais idosa do mundo, já que o posto é ocupado oficialmente pela espanhola María Branyas Morera, que está no “Guiness Book”, o “Livro dos Recordes”, mas é três anos mais nova que a brasileira.
— Já consegui a cópia da certidão de nascimento dela e agora estou atrás da de batismo, que enviaremos para o “Livro dos Recordes”. Ela tinha todos os documentos, mas os perdeu numa enchente — diz Juair de Abreu Pereira, médico de Deolira.
Aos 105, Seu José virou estrela de supermercado
Outra centenária da pesquisa que esbanja saúde é Laura de Oliveira, que completou 105 anos no último dia 2. Ela mora sozinha em Belo Horizonte, faz a própria comida e cuida da casa. Adora tomar uma pinga — mas é só uma dose na hora do almoço, ressalta — e não come sem pimenta. O segredo da longevidade, acredita a mineira, está no DNA.
— Minha mãe morreu com quase 100 anos. Tenho duas irmãs na mesma faixa de idade, uma de 101 e outra mais novinha, que completou 99 em janeiro. Mas, pelos meus cálculos, elas têm mais. Acho que tem algum erro na certidão de nascimento — alfineta, brincalhona.
Aos 105 anos, José Bernardo da Silva dá expediente de segunda a sexta-feira num supermercado de Pouso Alegre, no Sul de Minas. O idoso cumpre uma rotina diária de seis horas de trabalho e já virou uma atração. Tem gente que vai ao estabelecimento só para conhecê-lo.
Uma de suas atribuições é recolher os carrinhos que os clientes abandonam vazios no estacionamento. Ele não para nem nos fins de semana, quando se dedica a cuidar da horta do abrigo onde vive longe dos familiares, que residem numa cidade vizinha.
— Comecei a trabalhar aos 15 anos e nunca mais parei. Fiz um pouco de tudo nessa vida: trabalhei na enxada, com carro de boi e já varri ruas — enumerou.
Como em todo estudo científico, os pesquisadores ainda não sabem quando terão as respostas para sua indagação. As análises não são individuais. Eles dizem que um caso sozinho não explica a longevidade e, para ter força de estatística, levam em conta o conjunto do material coletado.
— É preciso juntar dados de várias pessoas e compará-los, num segundo momento da pesquisa. Por isso um estudo científico demora. Estamos na fase de coleta de amostras e informações sobre estado de saúde dessas pessoas e como elas vivem — explica o biólogo Mateus Vidigal.
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