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Paulo Betti revive memórias em peça e brinca sobre passagem do tempo: 'Não sabia que era bonito'

Ator também fala sobre como é encenar momentos doloridos da vida, como a história do pai com esquizofrenia: 'Mesmo falando tantas vezes, ainda dói'

Agência O Globo - 13/07/2024
Paulo Betti revive memórias em peça e brinca sobre passagem do tempo: 'Não sabia que era bonito'

Desde 2015, Paulo Betti recria no palco memórias da própria vida e de sua família com a peça “Autobiografia autorizada”, que encerra a mais recente temporada no Rio neste fim de semana, na Caixa Cultural. A montagem é resultado de textos que o ator, de 71 anos, publicou por 25 anos em um jornal de Sorocaba (SP), terra natal dele. Para se preservar, no entanto, ele desenvolveu técnicas para não misturar totalmente a vida real com emoções cênicas.

— Sempre fui mergulhado nas memórias. Revisitar esses textos serviu para entender minha ancestralidade. Minha família não tinha letramento. Isso fez com que eu crescesse com essa responsabilidade de contar a história deles também. Ter a oportunidade de vivê-las no palco é emocionante. É como se minha mãe, meus avós e meu pai estivessem comigo. Não sei se é bom ou ruim para mim, mas as coisas são como são — resume Betti.

O espetáculo conta com boas doses de humor e mais um tanto de poesia. Mas há detalhes que ainda mexem profundamente com os sentimentos do artista. Paulo cresceu vendo o pai ter surtos de esquizofrenia:

— Somos de uma família pobre italiana que debocha muito um do outro. Até hoje. O humor vem daí. Já a situação do meu pai, ainda é a questão que mais me afeta. Mesmo falando tantas vezes, ainda dói. Mas a peça me ajudou a entendê-lo mais, as angústias de ele ser tomado pela doença.

Dessa época, não foram só os escritos que ele guardou. Há objetos afetivos no palco também.

— A faca que minha avó usava para matar porco eu uso em cena. Fiquei também com o cachimbo do meu avô. E uma pedra, um resto de um meteorito que caiu na nossa roça. Não sou acumulador. Só de memórias. Guardo fotografias, recorte de jornais...

Seria coisa de virginiano guardar e catalogar tudo?

— Sim (risos), e tenho ascendente em Áries. Mas acho que o que mais corresponde com a minha personalidade é meu Orixá, Ogum. Por conta da esquizofrenia do meu pai, minha mãe buscou ajuda em muitas religiões. Meu calcanhar de Aquiles é gostar de ser aplaudido, querer ser reconhecido, e tem ainda uma ira. Essa parte eu já melhorei.

A peça termina antes de o artista alcançar a fama. Outros escritos foram reunidos para um projeto futuro, de uma autobiografia em livro. Paulo Betti já tem contrato com uma editora, inclusive. Revisitar a própria vida e lidar com o passar do tempo, entretanto, não o atormenta.

— Sou filho temporão. Já nasci com minha mãe velha para a época. Eu vi meus avós se encaminhando para o fim. A noção de morte sempre esteve presente na minha vida. Acho que me acostumei. Procuro me manter ativo, fazendo atividades físicas. Estou conversado — diz, aos risos.

O paulista tem mudado até a forma como se vê. Observando a reprise de “Mulheres de areia” (1993), por exemplo, viu ali um galã, diferentemente de como se sentia na época:

— Eu não sabia que era bonito. Minhas filhas, já adultas, viram fotos minhas antigas e falaram: “Nossa, pai, você era gato”. Outro dia, entrei no elevador e uma fã mandou: “Você que era o Paulo Betti?”. Era!! (risos). Eu até coloquei essa passagem na peça.

Apesar da modéstia, o ator conquistou o coração de algumas mulheres também famosas. Com Eliane Giardini, ficou casado por 25 anos e teve duas filhas; com Maria Ribeiro, foram mais quatro anos de relação e tiveram um filho. Desde 2015, ele namora a atriz e humorista Dadá Coelho.

— Tem uma frase do Domingos Oliveira que diz: “Todos os amores que você teve permanecem de certa maneira, só que mudam”. Aquilo que você sentiu pelas pessoas não se apaga. Nós nos damos bem porque nos esforçamos em preservar o afeto e carinho.

Paulo conta que quer fazer uma nova festa de casamento. Mas desde que pediu a mão de Dadá, em 2019, a farra ainda não saiu.

— Estou enrolando (risos), mas vai ter.