Política

Cerveja nos EUA, voluntário em campanha e 'profecia': a ascensão meteórica de Eduardo Cavaliere até a vice de Paes

Em poucos anos, aliado do prefeito passou de um estudante de Direito que acompanhava pelo noticiário um país em ebulição para um ator relevante do jogo político carioca

Agência O Globo - 03/08/2024
Cerveja nos EUA, voluntário em campanha e 'profecia': a ascensão meteórica de Eduardo Cavaliere até a vice de Paes
Eduardo Cavaliere - Foto: Reprodução

Eduardo Paes costuma dizer que, quando leva o xará Eduardo Cavaliere para reuniões com figuras de peso da política, o aliado de 29 anos parece estar “assistindo ao Jornal Nacional”. É uma forma de ilustrar quão rápida foi a ascensão de Cavaliere, futuro vice da chapa de reeleição do prefeito do Rio, que em poucos anos passou de um estudante de Direito que acompanhava pelo noticiário um país em ebulição para um ator relevante do jogo político.

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O agora deputado estadual entrou na graduação da FGV no ano das jornadas de junho de 2013, espécie de pontapé inicial da turbulência política que se intensificaria nos anos seguintes. Na turma universitária, nadava contra a maré. Ao contrário da maioria dos colegas, achava uma bobagem o discurso antipolítica predominante nas manifestações — e tinha o prefeito do Rio, que sentia na pele o fervor das ruas, como maior referência.

Os anos se passaram e, depois de um intercâmbio na China, Cavaliere estava prestes a se formar em 2017. Fora da prefeitura depois de dois mandatos, Paes trabalhava na iniciativa privada e morava nos arredores de Washington, capital dos Estados Unidos, quando recebeu para um papo o estudante e outros dois amigos que participavam de um seminário na universidade Georgetown. Por meio do professor Gustavo Schmidt, ex-chefe de gabinete do prefeito, eles marcaram de se encontrar em um bar.

Cerveja vai, cerveja vem, Cavaliere insistiu que Paes deveria voltar à política e disputar o governo do Rio em 2018. Caso embarcasse na missão, disse o jovem, ele sairia do emprego ligado ao mercado financeiro em que estava na época e trabalharia como voluntário na campanha. Foi o que aconteceu.

Paes resolveu tentar a sorte na esfera estadual e, na esteira da onda bolsonarista e da derrocada do grupo ao qual pertencia no Rio até dois anos antes, chefiado pelo ex-governador Sérgio Cabral (MDB), perdeu o segundo turno para o azarão Wilson Witzel (PSC). Durante o período eleitoral, Cavaliere trabalhou como faz-tudo: dirigiu carro, carregou pasta e ficou à disposição do candidato. Entrou de vez no time, e logo num momento de baque político na trajetória de Paes.

Dois anos depois, na bem sucedida campanha de Paes de retorno à prefeitura, Cavaliere teve papel mais estratégico. Ao ajudar na coordenação, estabeleceu-se como um quadro das novas gerações que o prefeito gostaria de prestigiar no novo mandato. Em janeiro de 2021, assumiu a pasta de Meio Ambiente.

— Uma das missões a que me propus quando vencesse as eleições de 2020 era justamente trazer novos quadros e renovar a política no Rio. Acho que todo mundo concorda que precisamos — afirma o prefeito.

O período de Cavaliere no Meio Ambiente foi o suficiente para ele despontar de vez como um quadro do núcleo duro de Paes, que tem reuniões semanais, sempre às segundas, para discutir o cenário político. No lançamento da campanha de Cavaliere a deputado estadual, em 2022, o prefeito chegou a brincar com outros aliados ali presentes — entre eles, o deputado federal Pedro Paulo, seu maior parceiro na política e agora preterido na escolha da vice — ao dizer que o neófito seria prefeito do Rio antes de todos os outros.

Se naquele momento a fala era mais um empurrão eleitoral a Cavaliere do que uma profecia, fato é que a história se desenrolou de um jeito que Paes pode mesmo estar certo. Como ele cogita deixar o novo mandato no meio, caso reeleito, para disputar o governo do estado em 2026, o vice — também do PSD — assumiria a cidade daqui a dois anos, aos 31 anos . Seria o mais jovem da história a comandar a segunda maior cidade do país.

Mudança de patamar

Eleito para a Assembleia naquela eleição, o novo deputado mal teve tempo de montar o gabinete. Voltou à prefeitura para chefiar a Casa Civil, em um gesto que deixou cristalina a mudança de patamar que o prefeito lhe daria. À frente da pasta mais política da administração, intensificou um perfil que, a um só tempo, despertou de vez a confiança de Paes e irritou parte da classe política e de servidores.

É visto como alguém duro, grosso até. Às críticas, costuma responder que ocupava uma posição em que dizer “não” e exigir o cumprimento de metas era fundamental. Atribui ao estilo rigoroso de Paes e dos secretários o que considera o sucesso da atual gestão, que chegou a ter dados ruins de avaliação nos dois primeiros anos e agora virou a chave, segundo as pesquisas recentes. Até do ponto de vista físico, de gestuário, Cavaliere parece emular o padrinho político, com jeito de falar despojado e confiante.

Durante o turbulento processo decisório que levou à indicação para o posto de vice da chapa, novela que tirou o sono de Paes, Cavaliere submergiu. Consciente de que era a primeira opção caso Pedro Paulo de fato ficasse inviabilizado — o que se deu nas últimas semanas por causa da revelação de um vídeo íntimo —, entrou em compasso de espera, tomando cuidado para não parecer que conspirava contra aquele que era considerado no núcleo duro o candidato natural e mais preparado técnica e politicamente.

A quinta-feira passada foi de apreensão, sobretudo para Pedro Paulo e Cavaliere. O prefeito viajou a Brasília, onde comunicou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, antes de todo mundo, a decisão sobre o vice. Quando saiu do Palácio da Alvorada, o telefone de Cavaliere tocou. O presidente da República, até outro dia um “personagem de Jornal Nacional” para ele, era agora alguém que avalizava seu nome como o primeiro da linha sucessória na cidade que o próprio Lula sempre pinta como a “caixa de ressonância” do país.