Política

Justiça de SP nega pedido para arquivar ação contra Alckmin por suposto 'caixa dois' da Odebrecht

Decisão afirma que existem outras provas além das planilhas que justificam prosseguimento; defesa do ex-governador discorda e diz confiar que ação será extinta ‘em breve’

Agência O Globo - 06/08/2024
Justiça de SP nega pedido para arquivar ação contra Alckmin por suposto 'caixa dois' da Odebrecht
TJSP - Foto: Arquivo/TJSP

A 13ª Vara da Fazenda Pública do Estado de São Paulo negou, em decisão publicada no dia 25 de julho, pedido de arquivamento de um processo de improbidade administrativa e enriquecimento ilícito movido pelo Ministério Público contra o vice-presidente Geraldo Alckmin ( PSB). O ex-tesoureiro da campanha a governador em 2014, Marcos Monteiro, que também é réu no processo, havia solicitado a anulação das provas obtidas por meio de acordo de delação premiada com antigos executivos da construtora Odebrecht e, por consequência, o trancamento da ação.

O recurso movido por Monteiro decorre do entendimento recente do Supremo Tribunal Federal (STF) de que as provas colhidas em planilhas do Departamento de Operações Estruturadas da Odebrecht devem ser desconsideradas pela Justiça. Segundo a construtora, os sistemas Drousys e My Web Day B eram usados para organizar o pagamento de propina a agentes públicos. O Supremo, contudo, apontou manipulação inadequada das informações, com quebra da cadeia de custódia e contaminação das provas.

A Justiça de São Paulo alegou que o processo contra Alckmin deve prosseguir porque “subsistem outras provas independentes que amparam a continuidade”. Alckmin é acusado de oferecer vantagens à Odebrecht em seu segundo mandato em troca de doações ilegais de campanha de reeleição ao governo do Estado, em 2014.

A denúncia do Ministério Público narra que, no final de 2013, diretores da Odebrecht procuraram Monteiro, que era o responsável pelas finanças de campanha de Alckmin. Em troca de acobertar formação de cartel e superfaturamento de obras, que envolveriam, por exemplo, a construção da Linha 6 do Metrô de São Paulo, a construtora teria acertado a destinação de R$ 8,3 milhões por meio de esquema de “caixa dois”, ou seja, em recursos não declarados à Justiça Eleitoral.

Os pagamentos, segundo a denúncia, ocorreram em espécie, operados pelo doleiro Álvaro José Galliez Novis, o “Paulistinha”, e seu funcionário Rogério Martins. A entrega dos valores teria sido feita a pessoas indicadas por Monteiro, entre abril e outubro de 2014, por meio de malotes deixados em hotéis. Além de Alckmin e do ex-tesoureiro de campanha, os representantes da Odebrecht Luiz Antônio Bueno Júnior, Benedicto Barbosa da Silva Júnior, Hilberto Mascarenhas e Fernando Migliaccio da Silva também respondem ao processo.

A 13ª Vara da Fazenda Pública menciona como provas independentes presentes no inquérito duas transações da transportadora de valores Transmar nas dependências do hotel Mercure Privilege, em Moema, distrito localizado na Zona Sul da capital paulista. Os valores, de acordo com a análise do Ministério Público, não constam na prestação de contas de Alckmin naquela campanha eleitoral.

— O inquérito civil que instrui a presente ação civil pública evidencia, portanto, o modus operandi dos atos de improbidade administrativa imputados aos requeridos, de modo que o réu Marcos Antonio Monteiro, no exercício de função pública e em benefício de Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho, auferiu vantagem indevida, recebendo dinheiro da Construtora Norberto Odebrecht S/A — aponta trecho da decisão. O processo corre em segredo de Justiça, mas o GLOBO teve acesso aos autos.

O advogado Fábio de Oliveira Machado, que representa Alckmin, declarou por meio de nota que “os fundamentos da ação civil pública já foram objeto de várias decisões judiciais, incluindo do Supremo Tribunal Federal, e nunca prosperaram” e defende que “os supostos elementos probatórios contidos nesta ação judicial foram obtidos de forma ilícita e já declarados imprestáveis”. A defesa discorda da decisão do juízo de primeiro grau e confia que, “em breve, esse processo judicial será extinto”.

O GLOBO também procurou a defesa de Monteiro, conduzida pelo advogado Guilherme Corona, mas ainda não houve retorno.

Em 2023, Alckmin e Monteiro conseguiram o arquivamento definitivo de uma ação correlata de suposto “caixa dois” que estava tramitando na Justiça Eleitoral. A denúncia envolvia o recebimento de doações ilegais na ordem de R$ 11,3 milhões da Odebrecht nas eleições de 2010 e 2014. O ministro aposentado Ricardo Lewandowski baseou a decisão justamente na anulação das provas obtidas em acordo de leniência com a empresa, julgadas “imprestáveis” pela Segunda Turma do STF.