Brasil
Escala 6×1: 'Não podemos demorar mais 50 anos para melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores'
Em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, a deputada Dandara Tonantzin (PT-MG), uma das 134 parlamentares que assinaram o texto da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) pelo fim da escala 6x1, explicou a medida que pretende estabelecer a mudança trabalh
Popularizada como PEC pelo fim da escala 6x1, a proposta apresentada pela deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) inundou as redes sociais mobilizando milhares de brasileiros a discutirem o assunto.
Levantamento feito pela Sputnik Brasil utilizando uma ferramenta que aponta as principais tendências de buscas na Internet mostra que a procura pelo tema "escala 6x1" cresceu repentinamente nos últimos 7 dias, atingindo, até então, seu pico de buscas nesta terça-feira (12).
Para começar a tramitar na Câmara dos Deputados, a proposta precisa de 171 uma assinaturas, mas, até a divulgação de Hilton na noite de ontem (11), 134 parlamentares haviam assinado. Entretanto, abaixo-assinados mobilizados pela sociedade civil já somam mais de 2 milhões de assinaturas.
"A força desse projeto vem das ruas e do apoio popular. Não dá para o Parlamento brasileiro ignorar uma matéria que tem 2 milhões de assinaturas. [...] Há uma reivindicação legítima dos trabalhadores brasileiros de que se reveja a jornada de trabalho", comenta Dandara.
O que propõe a PEC pelo fim da escala 6x1?
Em linhas gerais, a proposta estabelece a jornada de trabalho de, no máximo, 36 horas semanais e 4 dias de trabalho por semana no Brasil, acabando com a escalada de 6 por 1, onde o trabalhador encara 44 horas de trabalho semanais.
O projeto foi inspirado em uma petição pública criada pelo movimento Vida Além do Trabalho (VAT), que tem a redução da jornada de trabalho como sua principal pauta.
À Sputnik Brasil a deputada Dandara Tonantzin afirma que o debate é urgente e vai de encontro as necessidades do século XXI.
"Assim como o mundo do trabalho está atualizando, as relações de trabalho também precisam atualizar. Nós precisamos garantir o bem viver, a qualidade de vida dos trabalhadores", ressalta.
A deputada ressalta, ainda, que o projeto visa a redução da jornada assegurando garantias ao trabalhador, ou seja, sem trazer prejuízos aos encargos recebidos e aos direitos conquistados ao longo do tempo. Para ela, a discussão proposta não pode deixar arestas para a "pejotização" ou para que o trabalhador passe a receber "por diária" ao invés de ter um salário fixo, como aconteceu com as empregadas domésticas, que, conforme ela relembrou, tiveram o trabalho precarizado após conquistarem direitos baseados na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
"Nós queremos o cumprimento dos direitos trabalhistas. Reduzir a carga horária sem reduzir o salário. Nós podemos fazer isso. Os países de primeiro mundo todos já estão atualizando para uma relação onde o trabalho se insere no dia a dia da pessoa sem se tornar um peso, um fardo", argumenta.
A qualidade de vida do trabalhador está na ordem do dia da proposta apresentada. O texto da PEC, por exemplo, fala em vida digna para os trabalhadores e condições de trabalho que favoreçam saúde e bem-estar.
"Seis dias de trabalho e um dia de descanso sobra muito pouco tempo para a pessoa conseguir ter outras dimensões da vida. E não é só descansar, não. É conseguir resolver as coisas de casa, dos filhos, da escola, da faculdade. É conseguir ir à igreja", acrescenta a deputada.
Se trabalhadores avançam em direitos, outros setores contrariam e fazem ameaças, diz deputada
A proposta também tem enfrentado resistência de partidos da oposição governista e de setores do empresariado, que já se manifestaram nas redes. O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), parlamentar mais votado nas últimas eleições, publicou em suas redes sociais criticas sobre a PEC, chamando o texto de "terrivelmente elaborado" e afirmando que a proposta teria impactos negativos, inclusive podendo ampliar o desemprego.
De acordo com Dandara, a ideia do projeto é "aquecer a economia", não criar prejuízos ao trabalhador.
Em relação aos setores contrários, a deputada afirma serem "setores que vivem na lógica de aprofundar as desigualdades, acumular mais riqueza, mais capital, e que não está nem um pouco preocupado com a qualidade de vida das pessoas". Segundo ela, as discordâncias apresentam, até então, "um discurso raso, simplista, tentando desqualificar a luta pela redução de jornada de trabalho".
"A história dos direitos trabalhistas no nosso país é uma história que caminha a passos lentos. [...] A Previdência Social foi conquistada em 1923. A jornada de oito horas de trabalho diária é um debate da década de 1920, de 1930, que lá em 1932 foi regulamentada. Só em 1940 se criou a figura do salário mínimo. O 13º vem em 1962. Nós não podemos demorar mais 50 anos para aprovar na Câmara uma legislação que vai melhorar as condições, as relações de trabalho, a condição de vida das pessoas", argumentou.
Jornada 4x3: o que o Brasil pode aprender com outros países?
De acordo com a deputada, a proposta de redução da jornada de trabalho tem implementações consistentes em outros países, como na Nova Zelândia e na Alemanha.
Dandara conta que na Nova Zelândia, mais de 90% das empresas que fizeram o teste da redução da carga horária semanal e, quando os testes foram encerrados, decidiram continuar adotando o formato 4x3.
"Na Nova Zelândia, inclusive, tem menos pedidos de demissão, menos desligamento porque as pessoas conseguem ser mais produtivas quando estão com a vida organizada, quando estão um pouco mais descansadas", comenta.
Já na Alemanha, segundo ela, uma pesquisa recente mostra que 70% das empresas decidiram também continuar no formato quatro por três.
"Eu não vi notícias de que a Nova Zelândia, de que a Alemanha tenha quebrado a economia por isso. [...] É algo que está dando certo em muitos lugares do mundo", defende a deputada.
Além da PEC apresentada por Erika Hilton, a Câmara dos Deputados tem, desde 2019, tramitando a PEC 221/2019, apresentada em 2019 pelo deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), que propõe uma redução, em um prazo de dez anos, de 44 horas semanais por 36 horas semanais de trabalho sem redução de salário.
Caso a proposta de Hilton obtenha as assinaturas necessárias, Dandara informou que o próximo passo é "pautar o quanto antes" a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, encaminhar a proposta ao plenário e construir a proposta com "o com o setor público e o setor privado".
"Nós queremos conquistar um novo direito trabalhista que também seja capaz de ser aplicado na prática. E que tenha um grande impacto com a sociedade, com os trabalhadores, com os empregadores de efetivação dessa lei", conclui a parlamentar.
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