Internacional
Guerra cibernética contra a Rússia: quais os impactos da estratégia do Ocidente a partir da Ucrânia?

Muito antes da operação militar especial na Ucrânia começar em 2022, membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) já iniciavam no país medidas para uma guerra cibernética contra a Rússia. Ações foram desde a criação do "Exército de TI da Ucrânia" até calls centers fraudulentos que tinham como principais alvos instituições russas.
Era década de 2010 quando a OTAN iniciava um plano para usar a Ucrânia em uma guerra cibernética contra a Rússia. Entre as iniciativas, estavam big techs como Google e Facebook (a Meta, proprietária da rede social, é proibida na Rússia por extremismo), que hospedaram softwares maliciosos para atuarem em eventos internacionais realizados no país, e até a instalação de mais de mil call centers fraudulentos para realizar ligações contra instituições russas que causaram prejuízos bilionários.
Outra frente de atuação foi o financiamento de um centro de campanha cibernética contra Moscou a partir de um "Exército de TI da Ucrânia", composto por uma rede de hackers cujo número de membros é estimado entre 100 mil e 400 mil participantes. As denúncias ainda incluem a atuação de equipes do Comando Cibernético do Exército dos Estados Unidos que prepararam ataques de rede contra a Rússia entre novembro de 2021 a fevereiro de 2022, pouco antes da operação militar especial começar.
E a escalada continua, conforme enfatizou por diversas vezes a representante oficial do Ministério das Relações Exteriores russo, Maria Zakharova, em declarações sobre o uso dos serviços de inteligência ocidentais para "uma campanha antirrussa em grande escala usando tecnologias de informação e comunicação para fins militares e políticos". Entre os países envolvidos, além dos Estados Unidos, estão Reino Unido, Canadá, Lituânia, Estônia, Polônia, Romênia, Croácia e Países Baixos.
O professor do departamento de engenharia mecatrônica e de sistemas mecânicos da escola politécnica da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em segurança cibernética Marcos Barretto concordou em entrevista à Sputnik Brasil que todas essas evidências mostram que a Rússia enfrenta hoje uma guerra mundial cibernética que, diferentemente dos embates tradicionais nos campos de batalha, pode ser silenciosa.
"O mundo vive isso, e a Rússia tem muitas pessoas contra ela, e isso acontece a mesma coisa contra a China. É uma guerra escondida, que a gente não vê e não está nas manchetes", resume, ao acrescentar que a atuação de diversas big techs a favor dos Estados Unidos é apenas "a pontinha do iceberg".
Com relação às declarações do então chefe do comando cibernético norte-americano, general Paul Nakasone, à Sky News em junho de 2022, quando admitiu operações cibernéticas contra alvos russos, o especialista diz que é "absolutamente" possível comparar a situação ao envio de soldados dos Estados Unidos ao campo de batalha, fazendo um paralelo ao mundo "offline".
"Mas, nesse caso, não temos vidas de soldados norte-americanos sendo expostas [...]. Então, essa é uma operação que é particularmente própria para a sabotagem, no caso, feita pela defesa da Ucrânia, por ser realizada durante a operação [militar especial russa] propriamente dita", afirma.
Para o especialista, os conflitos mundiais ocorrem cada vez menos nos campos de batalha, com armas convencionais, e mais com artifícios econômicos, como as sanções, desconstrução da opinião pública e, claro, os ataques cibernéticos.
"Todos esses elementos são cada vez mais relevantes na guerra moderna. Portanto, ter um exército de call centers atacando seu inimigo permite, por exemplo, enganá-los para desviar fundos e construir uma modificação da opinião pública em relação a algum tema específico, com a destruição da credibilidade. Então, realmente, são tempos em que ataque e defesa cibernéticos são elementos tão decisivos quanto drones", argumenta.
Rússia adquiriu 'forte' resiliência ao lidar com os ataques
Em meio à globalização de processos econômicos e comerciais, boa parte da infraestrutura tecnológica também passou a ser compartilhada e até gerida em rede, o que também as torna mais propensas aos riscos de ataques cibernéticos. Nessas situações, segundo o pesquisador do pós-doutorado no Instituto de Geociências da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Gustavo Glodes Blum, a área de defesa é uma das mais afetadas.
"Servidores, cabos de comunicação e satélites não apenas dependem da atuação conjunta de instituições e empresas de outros países, mas inclusive encontram-se em espaços em disputa [...]. Isso poderia nos levar a responder que sim, que a Rússia passa por um processo que envolve não apenas seu conflito direto com a Ucrânia, mas também com países fornecedores de equipamentos e sistemas de informação", explica à Sputnik Brasil.
Apesar disso, o especialista ressaltou a forte capacidade de Moscou de resistir a potenciais ataques em função da "autonomia obtida diante das sanções aplicadas desde 2022" e ainda "testes de desligamento da Internet global realizados nos últimos anos".
Já em relação à Ucrânia, todo esse "apoio" ocidental, incluindo a atuação das big techs, terá altos custos, prevê o especialista.
"Um deles é a dependência cada vez maior das vontades de um grupo de bilionários que pode torná-la alvo de retaliações inesperadas. Um exemplo é o uso de satélites da Starlink e as ameaças de Elon Musk de parar de fornecer esse apoio. Então tanto os dados dos ucranianos ficam expostos quanto eles dependem de aliados que não são muito confiáveis", finaliza.
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